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DOIS IRMÃOS

Atualizado: 5 de dez. de 2023



-RUI VIANNA-



Dois irmãos são morros em Fernando de Noronha, que aparecem como uma das mais tradicionais paisagens da Ilha. Podem ser também Caim e Abel, que protagonizam a tragédia bíblica, carregada de ira e rancor. Podem ser o Leandro e o Leonardo, os sertanejos, ou ainda os irmãos Cohen, de extensa e meritória obra cinematográfica. Bom, encurtando o assunto, dois irmãos podem ter muitos significados, muitas histórias e muitas interpretações. A que me interessa agora é a paisagem, deslumbrante, em torno desses dois maciços de rochas vulcânicas.

Naquele que seria um santuário ecológico, com sua natureza exuberante, há problemas que trazem sobressaltos e aflições àqueles com um mínimo de consciência ecológica e preservacionista. Apesar de uma forte corrente de rejeição aos plásticos descartáveis em Fernando de Noronha, há uma quantidade enorme de veículos, de todos os tipos, entre caminhões, ônibus, motos e carros. Existem vários pontos de aluguéis de bugs e motos, que circulam incessantemente, coisa que não ocorre em outras ilhas da costa brasileira como Ilha Grande e Morro de São Paulo. A queima de combustível fóssil já é, em si, uma ameaça ao frágil equilíbrio do meio ambiente, somente pela existência dessa quantidade expressiva deles. Mas não para por aí.


Como me disse uma jovem local, inflamada pela sua indignação:


"O pessoal só olha pra plástico!"


A explosão veio quando, percebendo que ela prestava atenção à nossa conversa, que girava em torno de um cata-vento eólico que vimos dentro de uma pousada, perguntei-lhe:


Você sabe qual é a fonte de energia na Ilha?


E ela me respondeu, ainda mais indignada:


"Pois é, a energia aqui é gerada por termoelétrica. Queima de diesel!"


Foi então que pude colher a primeira impressão de que algo realmente não está correto. Todo o combustível existente em Fernando de Noronha é levado em barcaças, que partem de Recife. Além de caríssimo (um litro de gasolina, vendido no único posto da ilha, custa R$ 7,28, o diesel R$ 5,79!), demora pelo menos 24 horas para chegar. E, pior do que isso, é usado para gerar energia necessária para ligar os aparelhos de ar condicionado e toda a sorte de utensílios de questionável utilidade, e assim queima-se milhares de litros de diesel.


Senti-me tão ou mais indignado que a jovem. Com o potencial eólico da ilha, onde venta muito, o tempo todo, ou ainda de geração de energia fotovoltaica, teríamos energia limpa, muito mais barata, sem a ameaça real ao equilíbrio delicado do ecossistema local e , ainda, muito mais confiável.


Foi então que, conversando com outro ilhéu, este o piloto e comandante do barco que nos levava em um passeio, questionei a razão de não se tentar fontes de energia alternativas na ilha, como a eólia ou a fotovoltaica. Ele me disse:


"Teve uma época que foi instalado um desses cata-ventos aqui, perto do porto. Acontece que andaram morrendo algumas aves, que se chocavam com as pás. Daí o IBAMA resolveu que não podia, e as entidades daqui insistiram que tinha que ficar. Aí, tira, não tira, tira, não tira, deu uma tempestade e a natureza deu um jeito. Caiu um raio no danado e derreteu ele. Nunca mais puseram."


Notícia da época. (14/03/2009)


(Mas, pensei eu, e aquela pequena turbina da pousada? Teria sido proibida também?)


Me informando mais um pouco, vi que há um movimento recente no Ceará, realizado pelo Fórum Ceará no Clima, conclamando a impedir a implantação de usinas termoelétricas, essas movidas a carvão, que trazem informações assustadoras sobre essa fonte de energia, conforme vemos abaixo:



Em pesquisa rápida pela internet, achei muito pouca coisa quanto à implantação de projetos de energia limpa na Ilha. Este link traz informações sobre placas fotovoltaicas- https://neoenergiasustentavel.com.br/ilha-inteligente/ . Mas fala em, no máximo, geração de 10% da energia necessária ao abastecimento. E só.


Em um último esforço de pesquisa, vi que a participação da energia eólica na capacidade instalada no país é de apenas 8%, apesar de seus 518 parques de produção, até 2018. Somente no ano de 2015 (o que aconteceu depois disso, mesmo?), entraram em operação mais de 100 usinas eólicas no Brasil, com cerca de R$ 20 bilhões em investimentos. Considerando o benefício, um valor bem menor do que se comparado com outras fontes. Os dados podem ser conferidos no link:

www.suapesquisa.com/energia/energia_eolica_brasil.htm


Ah, há também o problema de abastecimento de água, seríssimo por lá, na voz de mais alguns ilhéus com quem conversamos. Talvez esse assunto fique para um próximo texto.


Que me esclareçam os doutos especialistas, eu estou aqui só para provocar.


 

Rui Vianna, além de aposentado e torcedor do Santos FC, adora viajar e perguntar.


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2 Comments


Guilherme José Purvin de Figueiredo
Guilherme José Purvin de Figueiredo
Jun 16, 2019

Com muito atraso, gostaria de fazer alguns comentários acerca do excelente texto do mês publicado pelo Rui Guimarães Vianna na Revista Pub. Conheci a Fernando de Noronhai há muitos anos, se não falha a memória há 16 anos ou mais. Da mesma forma que o autor do artigo, também fiquei chocado com o fato de haver sido desativada a usina eólica por determinação oficial. Ali foi instalada a primeira usina eólica do país, no ano de 1992, o que revela a preocupação na época com a proteção da qualidade ambiental. No entanto, já na época de minha visita a usina estava desativada devido às mortes de aves em rota migratória. Na época, fui informado que a interdição foi resultado…

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juliocesarsuzuki
juliocesarsuzuki
Jun 12, 2019

Ainda que todas as fontes de energia sejam poluentes e impactantes, assim nenhuma é radicalmente limpa, há diferentes níveis de impacto em cada uma delas. Optar pela energia solar ou pela éolica é urgente!!!

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