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O POVO KARIPUNA: UMA POLÍTICA DIZIMATÓRIA COMO VIOLAÇÃO AOS DIREITOS INDÍGENAS

Atualizado: 5 de dez. de 2023

- Marialice Antão de Oliveira Dias -


Em 2004 havia quatorze sobreviventes: não há indicador mais contundente da desastrosa história de contato desse grupo com os não-indígenas. O ciclo da borracha no início do século XX pode ser considerado o marco inicial da sequência de mortes e invasões em seu território tradicional. Esse foi também o período de construção da ferrovia Madeira-Mamoré, que levou dezenas de milhares de migrantes à região dos grupos Kawahiba, trazendo mortes advindas de doenças ou conflitos.

Os primeiros contatos dos Karipuna com segmentos da sociedade não-indígena ocorreram quando seringueiros começaram a penetrar os afluentes do alto rio Madeira, no primeiro boom da borracha, nas primeiras décadas do século XX. Não se tem registros de ataques ou “correrias” efetuadas por seringalistas a estes índios, tampouco os remanescentes mais velhos do grupo os mencionam. Mas os Karipuna há relatos de que invadiam “colocações” isoladas na região compreendida entre os rios Mutum-Paraná, Contra, Capivari e Jacy-Paraná para levar panelas, roupas e espingardas. A penetração das frentes de extração de borracha, crescente a partir de 1910, e a construção da Estrada de Ferro Madeira Mamoré (EFMM), levando a constantes choques entre “índios bravos”, seringueiros e trabalhadores desta estrada, obrigaram o extinto Serviço de Proteção ao Índio (SPI) a estabelecer uma série de Posto de Atração no antigo território federal do Guaporé, na década de 1940, sobretudo na bacia do rio Madeira. Dois destes Postos, “Coronel Tibúrcio” e “Tenente Marques”, estavam estabelecidos na área de domínio dos Karipuna acima descrita: o primeiro no rio Capivari e o segundo na margem esquerda do rio Mutum-Paraná. Ambos, segundo um relatório de 1949 da 9ª Inspetoria Regional do SPI, estabelecida em Porto Velho, viviam numa situação de indigência, não tendo a menor condição de cumprir sua missão institucional. Apesar do não cumprimento dos acordos, a Terra Indígena Karipuna foi demarcada em 1997 com 152.930 hectares e se encontra homologada (Decreto s/nº de 09/09/1998) e registrada nos cartórios de registro de imóveis de Guajará-Mirim e Porto Velho, sendo notável a presença indígena no espaço urbano.

Um Posto de Vigilância da Fundação Nacional do Índio (Funai) localizado na Terra Indígena Karipuna, distante a 280 quilômetros de Porto Velho, em Rondônia, foi incendiado por invasores, segundo denúncias de lideranças Karipuna. Os indígenas constataram o ataque criminoso quando passaram em frente ao posto, que fica a distante 10 quilômetros da aldeia Panorama (a única do território). Os principais suspeitos são madeireiros.

O Ministério Público Federal de Rondônia, desde que começou a investigar as denúncias de invasão de territórios indígenas no Estado, a0lertou para o risco de genocídio do povo Karipuna. O procurador da República Daniel Lobo expediu uma Recomendação para que a Funai elaborasse um plano emergencial de ação e autorizasse a liberação de recursos “para assegurar a proteção do povo Karipuna e a integridade de sua área demarcada”, em região dominada por grileiros e madeireiros, formadas “organizações criminosas” que agem no local. A assessoria do Ibama foi procurada para responder sobre a operação mencionada por Adriano Karipuna, líder da TI, que teria sido a causa da retaliação de invasores no posto da Funai. O Ibama não respondeu especificamente sobre esta operação, mas disse que nos últimos três anos realizou 15 operações de fiscalização dentro e no entorno da Terra Indígena (TI) Karipuna.

As ações de fiscalização ocorreram no âmbito da operação Máfia da Tora (Operação Conjunta denominada MÁFIA DA TORA com o objetivo de combater organização criminosa especializada em extração de madeiras em terras indígenas, sonegação, falsidade ideológica, crimes ambientais e lavagem de dinheiro), realizada pelo Ibama em conjunto com a Polícia Federal e a Receita Federal. Outras operações na TI Karipuna estão previstas no Plano Nacional Anual de Proteção Ambiental do Ibama. É uma população muito pequena, contando com 28 pessoas, cuja autodenominação é Ahé, e a família linguística Tupi- Kawahiba, tornam-se alvo fácil de invasores. Têm ainda a chance de mostrar a todos a importância da preservação da natureza, levando ainda ao restante do mundo, mesmo que implicitamente, a mensagem de que os “selvagens”, não são os indígenas que vivem no meio da floresta, sim os que vivem “civilizadamente” nas cidades, que poluem e destroem o próprio planeta onde moram. Os índios ensinam que são os verdadeiros sábios. Mesmo os índios tendo autonomia para transações comerciais, devem seguir as leis de proteção ambiental, já que essas são válidas para todos, inclusive para os indígenas. Nota-se que há tanto benefícios quanto malefícios para as aldeias, mesmo sendo legal a atividade, o benefício maior foi para o planeta e não para a aldeia.

 

Marialice Antão de Oliveira Dias - Doutora pela Université de Limoges/França. Ativista pelas causas indigenistas.

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