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Como reduzir em mais de 50% o analfabetismo na República do Paraná

Atualizado: 19 de dez. de 2023

-JOSÉ ELEUTÉRIO BRANDÃO ALVES-




Arte - Aloísio Van Acker

I

Naquele tempo, Alice Ruiz, Cristóvão Tezza, Dalton Trevisan, Emiliano Perneta, Helena Kolody e Paulo Leminski já se achavam exilados do país, por conta de processo penal ajuizado pelo Procurador de Justiça Dimas Alencar da Silva, que cumulava suas funções no parquet com as de Juiz Universal, Deputado e Presidente da República Separatista do Paraná. Os escritores pediram asilo na Bahia, onde foram recebidos com muita festa por Castro Alves, Jorge Amado, João Ubaldo Ribeiro e Zélia Gattai.


Dimas Alencar da Silva então achou por bem avocar a presidência da Academia Paranaense de Letras. Sua primeira providência foi mandar para a reciclagem todos os exemplares de Kalaf Epalanga, Kátia Canton, Lygia Fagundes Telles, Luís Bernardo Honwana, Moacyr Scliar, Ondjaki e Oswald de Andrade da biblioteca. Motivo: jamais aceitara a reintrodução das letras “K”, “W” e “Y” em nosso alfabeto.


Como ocupava a cadeira n. 14, cujo patrono era Franklin Távora, propôs a substituição do nome do escritor homenageado para Sara Natércia da Silva, sua esposa, que também era poeta nas horas vagas. A proposta foi aprovada sem ressalvas.

 

II

Em seguida, submeteu a votação o primeiro ponto da pauta:


— Caros acadêmicos! Dispomos hoje de 27 letras, metade delas completamente despiciendas. Apresento, pois, uma proposta que poderá revolucionar a nossa ortografia e simplificar o processo de alfabetização de nosso povo, reduzindo-o a 50% menos um do número atual. Vivemos um momento de crise econômica e creio que todos concordarão que devemos abandonar certos estrangeirismos e luxos intelectuais. Assim, submeto aos imortais a proposta singela de abolir de nosso alfabeto as letras “H” e “J”.


Os ocupantes das cadeiras 17 a 25 abstiveram-se de votar, mas os demais acadêmicos aplaudiram entusiasticamente a proposta.

 

III

O Presidente, animado com a aprovação de seu pleito, ousou ir um pouco além.


— Cumprimento a Academia pela aprovação da proposta. A redução no número de letras do alfabeto não só acelerará o ensino como também servirá para reduzir o número de páginas dos livros. Isto será recebido pelos ecologistas como verdadeiro mimo, concordam? Assim, amplio o escopo da reforma para tornar proscritas as letras “Q” e “X”.


Os aplausos não foram menos intensos. O aditamento estava aprovado.

 

IV

— Os imortais da Academia são patriotas autênticos! Como é consensual a proposta de se acelerar o ensino do alfabeto para as crianças pela redução do número de letras, contribuindo para a pronta erradicação do analfabetismo e permitindo assim que as nossas indústrias contem com maior número de crianças nas linhas de produção, por que ser tímido?! Morte às letras “V” e “Z” em nosso idioma!


Os acadêmicos ergueram os braços em apoio ao Presidente, prorrompendo em caudaloso aplauso.

 

V

— É bela esta Academia! Adiante, pois! Pela retirada das letras “B”, “F”, “G”, “O” e “U” do rol das letras!


Palmas e mais palmas para Dimas. Restaram apenas 12 letras, A, C, D, E, I, L, M, N, P, R, S e T, na placa: “DIMAS ALENCAR DA SIL_A - PRESIDENTE DA ACADEMIA PARANAENSE DE LETRAS”.


 

JOSÉ ELEUTÉRIO BRANDÃO ALVES - Natural de Goa (Índia), o autor é cronista e viajante. Já morou em Macau (China), Timor Leste, Moçambique, Angola, Cabo Verde, Guiné Bissau e São Tomé & Príncipe. Atualmente reside no Brasil.





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