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Nossa bandeira jamais será daquela cor...

Atualizado: 5 de dez. de 2023

- Elizabeth Harkot de la Taille e Guilherme José Purvin de Figueiredo -


Estamos numa época de resgate de lembranças do glorioso passado brasileiro – uma época em que, como todos sabem, não havia filas de doentes nos hospitais, todos gozavam de saúde e juventude e o arco-íris tinha seis cores: violeta, anil, azul, verde, amarelo e laranja.


No Brasil do regime militar, não havia assaltos por um simples motivo: as crianças recebiam desde cedo os ensinamentos de Educação Moral e Cívica e sabiam que só se vence na vida pelo trabalho honesto. Com seus lápis de cor, pintavam o verde de nossas matas, o azul de nossos céus, o amarelo de nosso ouro. Dispensável apenas o último lápis (que estava sempre intacto), já que o papel é sempre branco.


O povo cantava espontaneamente o hino nacional toda manhã saudando com vigor e alegria os Generais Humberto de Alencar Castelo Branco, Artur da Costa e Silva, Emílio Garrastazu Médici, Ernesto Geisel e João Batista Figueiredo, homens realmente amados por sua vasta cultura, seu amor ao povo mais simples, sua sensibilidade extremada para a correção de injustiças sociais, todos em seus uniformes verdes. Guarde a cor, leitor: verde! Não era outra a razão de não existirem na época favelados, ateus, mendigos, gays, comunistas, aleijados e negros.


Que tempos edênicos! Para garantir o equilíbrio, Eva ainda não havia sido criada (ao menos nos lugares de poder). Como todos eram brancos, heterossexuais e musculosos, e não havia Eva politicamente ativa, todos eram castos!


É bem verdade que a bandeira do Acre tinha uma estrela sanguinolenta no canto superior esquerdo. A da Paraíba então era um escândalo: o fogo dominante só aceitava repartir espaço com uma faixa vertical preta. Dos três estados do Sul, a de Santa Catarina era um sanduíche: em cima e em baixo é comprimida por duas espessas faixas rubras e a do Rio Grande do Sul era formada pelo verde e o amarelo agasalhando a diagonal ascendente (perdoem a expressão) vermelha, que a permeava. Bonita mesmo, pra valer, era a bandeira do Paraná. Azul, branca, verde... Cores de uniformes militares, cores frias, de europeu civilizado. Não causa estranheza que tudo tenha começado em Curitiba. E começou tão bem, com tanto esmero, que as poucas aberrações esquerdopatas que persistem vão ser bem logo varridas do país! Não tenho a mínima dúvida. E provo. Você viu, não viu, o logo e o slogan do Governo Bolsonaro?


Tudo está nele, toda a verdade. Sobre um fundo branco, azul claro em dégradée ou cinza azulado tendendo ao branco, a logomarca encerra, até que enfim, o presente e o futuro. Ela inspira a esperança no fim dos problemas. E, assim, nutre de felicidade serena quem com ela comunga.


Bem, há uma versão dinâmica da logomarca, que não sei reproduzir, mas que é infeliz e confunde.  Quando se chega a ela, o que se vê é o desenho completo, como aqui. Só que, aí, a bandeira do Brasil desce e desaparece, restando apenas a faixa verde, maior à direita.


Depois a bandeira some e fica incompleta, por baixo da faixa verde e mais outra branca, sempre grandes à direita. 


Ainda depois, a bandeira desce e desaparece de novo, como um dia após o outro, o Sol se pondo e renascendo.


Isso não é bom, preciso dizer. Quem vê esse vai e vem não tem a segurança de saber se a bandeira morre ou nasce ou pode até duvidar de que o progresso que se aproxima será definitivo! É muito perturbador.


Todavia, contudo, entretanto, porém, a imagem fixa é muito superior à dinâmica, por dois motivos: a bandeira brasileira está presente com suas quatro cores - verde, azul, amarelo e branco - e a faixa verde que se desdobra do canto inferior direito para cima e para a esquerda simboliza o raiar de uma nova era para o Brasil; mais importante, a imagem é estática, e isso nos conforta - entre nós, uma riqueza a mais, ela sutilmente sugere um movimento que nossos toscos inimigos não perceberão!


Se pensarmos na paz que ela comunica, com a bandeira quadricolor brasileira encoberta em sua terça parte por uma faixa verde, linda faixa verde, com sua moldura branca, e a examinarmos com atenção, veremos mais sinais da verdade que se instala.


Podemos observar que a bandeira brasileira é colocada em movimento pela pressão alviverde vinda do canto direito inferior. A cor verde, que já ocupava a maior área na bandeira brasileira, passa a ter ainda mais espaço. A cor branca não passa de uma moldura.


Ah, alguns de nós aprendemos na escola que o verde da bandeira significava as florestas. É tempo de corrigir essa distorção! Nosso governo bem sabe que o mato que cobre muito do território brasileiro precisa ser limpo para dar lugar ao desenvolvimento. Nada de quintais com folhas a serem varridas! Doravante, nosso país será limpo de mato e todo seu espaço será utilizado pelo desenvolvimento, até que devidamente cimentado. Acabou chorare! Acabou mimimi. Nada da sujeira que cai das árvores! E isso quer dizer maior liberdade para as mulheres, sem quintais a varrer! Progresso é isso, mais ganho e menos trabalho. O verde que vai tomando espaço, é preciso reconhecer, é o verde oliva das fardas do exército! Do exército que vai dar conta da segurança externa – seu papel tradicional – mais a interna. E que, generosamente, se propõe a cuidar da educação!


Podemos notar que a inscrição “governo federal” tem o menor destaque. Isso é muito bom! Embora em caixa alta, é colocada nas menores letras, além de pálidas e espaçadas, o que mostra a intenção de levar o projeto de nação eleito a despeito dos três poderes (lembrando, contudo, que um cabo e um soldado sempre poderão colaborar com o quarto poder - o moderador)! Coloca essa corja em seu lugar: pálido, menor, com pouca coesão. Brilhante! Ou sirvam ao que lhes é maior ou desapareçam.


Naquilo que há escrito, a maior menção é ao “Brasil”, claro! Porém, o que mais chama a atenção, é preciso sermos honestos, é a inscrição “PÁTRIA AMADA”. Assim mesmo, em caixa alta. Não remete a grito histérico nas mídias sociais, mas a uma VERDADE. O pobre “filósofo” francês, Compte-Sponville (1995 :241), acha que “[o] cérebro e o sexo não são músculos [...] não amamos o que queremos mas o que desejamos, mas o que amamos e não escolhemos...” Nada disso. O slogan do Brasil nos liberta dessa falácia: amar a pátria é uma VERDADE. Simples assim, como 2 e 2 são 4. Quem não ama a pátria não merece nela viver.


Por fim, e entre nós, o maior sinal de que nosso tempo é reconfortante, não apenas por retomar o passado, é sua promessa de futuro vinda ao contrário das representações esquerdistas, que privilegiam a esquerda (sempre a esquerda!) como ponto de partida, como se nos orientássemos necessariamente da esquerda para a direita, como se, numa linha do tempo, a passagem do tempo sempre fosse representada por 1, 2, 3, 4, etc., da esquerda para a direita.


Volto ao clímax desta reflexão: a sugestão de movimento da logomarca, isto é, a faixa verde que cresce à direita, movimenta a bandeira do Brasil para fora de sua posição central, fazendo-a cair fora pela esquerda, enquanto a mesma faixa verde cresce e toma todo o espaço.

A tradição reza que o verde é a cor da esperança!

 

Elizabeth Harkot de la Taille, Doutora em Semiótica e Lingüística Geral pela USP, é Professora Associada Livre Docente da Universidade de São Paulo nas áreas da Língua Inglesa e Linguística. Guilherme José Purvin de Figueiredo, Doutor em Direito pela USP, é Coordenador Geral da Associação dos Professores de Direito Ambiental do Brasil e Editor da Revista PUB - Diálogos Interdisciplinares.



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