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Lira paulistana e suas crias - Premeditando o Breque

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    Revista Pub
  • há 1 dia
  • 4 min de leitura

-RUI VIANNA-



Arte - Aloísio Van Acker
Arte - Aloísio Van Acker

O grupo Premeditando o Breque (que iria virar Premê, como advertia o LP), sempre se destacou pelo humor. E, mais do que isso, pela qualidade instrumental de suas músicas. Não há como negar o ecletismo que sempre norteou esses pioneiros do saudoso Lira. Misturavam de tudo, samba, roque, frevo, erudito, cordas, percussão, teclado, uma salada da melhor qualidade.


Seu primeiro e mais emblemático álbum tinha simplesmente o nome da Banda, Premeditando o Breque, e trazia uma foto dos seus integrantes em ringue que tanto poderia ser de tele-catch como de boxe. Só não de MMA ou UFC, que isso ainda não existia naqueles longínquos idos de 1981. Tem músicas absolutamente impagáveis, como a valsinha "Conflito de Gerações", onde o pai desesperado questiona o modus vivendi do filho, afirmando que "... tens a mania arrogante de fazeres versos e a petulância maior de tocares violão...", ofensas que, provavelmente, vários dos membros do grupo devem ter ouvido calados. Não é um verdadeiro luxo poder presenciar uma letra onde a segunda pessoa do singular é utilizada com tanta elegância!? E, no LP, ao final do lado A, vozinhas aceleradas mandavam o comando: "Vira o disco!"


Ou o samba de breque, sustentado por cordas refinadas e vocais hilariantes, "Brigando na lua", onde o personagem vai parar na lua ao ser sequestrado por "...uma coisa verde um tanto louca, tinha três olhos, duas bocas..." , e acaba se desentendendo com o Rei (?) da Lua e brigando sem gravidade (sem duplo sentido, literal) "Pontapé, soco no olho e cascudão", que terminam com a volta deste à terra, após tomas um táxi, e acaba na "...sala de massagem..." da delegacia, pelas mãos do investigador Denílson.


Como ponto alto do humor, uma jóia da música portuguesa, onde o personagem central é o avô que, de forma insuportável para a família, só quer comer chantilly com salsão. O non sense da letra é realmente impagável, com uma passagem do renitente ancião pelo psiquiatra, que sugere "...tremoço com fanta...", com delicioso sotaque lusitano. Me lembro que, à época, se tornou um desafio para meus chegados decorar o pedaço da letra em que eles misturam todos os versos fora da ordem em que aparecem.


E, talvez, a que fez o maior sucesso naquele tempo, uma marchinha carnavalesca como indica o nome, "Marcha da Kombi", que conta a história do feliz e contrariado proprietário duma Kombi meia seis, comprada diretamente de um japonês. "Ela é ensinada, ela é uma brasa, corre à beça e vai sozinha pro CEASA". E temina com o personagem aborrecido afirmando que a "...é só CEASA, é só CEASA, tem mais de um mês que eu não volto pra casa!"


Me perdoem se me prendo exclusivamente a este álbum da banda, mas o faço por motivos sentimentais. Claro que alguns dos posteriores tiveram sucessos indiscutíveis, como o segundo, Quase Lindo, que trazia o hit São Paulo, São Paulo, uma sátira (claro!) à música New York, New York, onde destrincharam as várias origens e os paradoxais encantos da metrópole. Mas minhas memórias do período ficaram indelevelmente marcadas pelo humor e a música de altíssima qualide. E, de bom gosto, fiquei por ali.


Como fica claro, a união de um esmero musical e um humor totalmente non sense, sem contudo beirar o politicamente incorreto, é hoje motivo de saudade sem remédio, diante da mediocridade generalizada do atual cenário musical. Pelo menos no meu ponto de vista.


Neste período, o Premê era formado por Marcelo (Antônio Marcelo Galbetti), Claus (Claus Erik Petersen), Igor (Igor Lintz Maués), Mário Manga (Mário Augusto Aydar) e Wandy (Wanderley Doratiotto) . Wandi transitou pelo mundo da propaganda, e foi protagonista da série memorável de anúncios da Brastemp, que celebrizaram o bordão "Não é assim uma Brastemp..." . Foi também foi apresentador de um programa de música ao vivo na TV Cultura, por vários anos.


A discografia de estúdio do grupo é bastante desigual, e traz os álbuns:


Não é demasia citar aqui Guilherme Purvin, comentando a formação musical e excelência do grupo:


"O Premê, por sua vez, surgido no ambiente do Departamento de Música da ECA, levava ao extremo a fusão entre virtuosismo instrumental e sátira social. Seus integrantes — Wandi Doratiotto, Claus Petersen, Osvaldo Luiz, Azael Rodrigues e Cláudio Biafra, que depois adotaria o nome artístico Mário Manga — dominavam não apenas os instrumentos (cavaquinho, flauta, violão, teclado, percussão), mas também os códigos da paródia, do teatro de revista, da crítica política. Um exemplo clássico é a execução da Marcha Turca de Mozart com quatro cavaquinhos — não como "graça", mas como comentário musical sobre a colonização do repertório erudito."


Por essas e por tudo, o Premê (que continua ativo), marcou época no cenário artístico paulistano e brasileiro, e algumas gerações de aficcionados pela Música.



Rui Vianna é advogado aposentado e associado do IBAP.



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