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IMPEDIR O PROJETO ECOCIDA DE BOLSONARO É URGENTE: DEFENDER A FLORESTA E SEUS POVOS, FUNDAMENTAL!

-JOÃO ALFREDO TELLES MELO-

-DEODATO DO NASCIMENTO AQUINO-


A maior floresta tropical do Planeta está sob ataque. Está, literalmente, sob fogo cerrado, que consome sua rica biodiversidade, seus ciclos vitais e suas relações ecossistêmicas, com impactos socioambientais, econômicos, étnicos, culturais e políticos ainda não completamente dimensionados. Não seria, de forma alguma, um exagero dizer que hoje, na Amazônia, se define não só o futuro da grande floresta tropical, de sua fauna, sua flora, seus rios e seus povos originários e tradicionais, mas da própria humanidade.


Pretendemos, aqui, de forma bastante sucinta e sem a pretensão de esgotar o tema, apontar as causas, especialmente políticas, do processo de degradação (portanto, aqui não se estenderá sobre os dados já bastante conhecidos, dos incêndios e desmatamentos já amplamente divulgados pela imprensa) a partir da eleição do novo (des)governo, demonstrar que é um projeto (ECOCIDA!) para, ao final, apontar algumas saídas para evitar a catástrofe.


A eleição da extrema-direita e sua política ambiental de terra arrasada

Para compreender o que está acontecendo atualmente no país, é preciso entender o que significa a aliança de forças que o governa . Por outro lado, não é possível compreender a eleição da chapa Jair Bolsonaro, presidente, e Hamilton Mourão, vice, sem uma série de eventos, que se iniciam com a decretação do impeachment sem causa da ex-presidente Dilma Rousseff , seguindo-se da condenação e prisão sem provas do ex-presidente Lula, que sempre esteve à frente das sondagens eleitorais até ser impedido de disputar as eleições de 2018.

A arquitetura desse golpe institucional (legislativo e judicial), com o apoio de amplos setores da burguesia e dos meios de comunicação em massa (em especial, da poderosa Rede Globo), ficou evidente com a nomeação do ex-juiz Sérgio Moro – o algoz que investigou, julgou, condenou e prendeu Lula – , como ministro da justiça do governo Bolsonaro. A verdade, que veio à tona a partir dos vazamentos de conversas entre o então juiz Moro e os promotores de justiça, Deltan Dallagnol à frente, pelo portal The Intercept, trouxe os detalhes imorais e ilegais de toda a armação judicial realizada para condenar e prender o ex-presidente. Não se pode olvidar ainda, durante o processo eleitoral, da utilização massiva e ilegal de “fake news” patrocinada pela campanha de Bolsonaro, por orientação do “guru” da extrema-direita mundial Steve Bannon, que utilizou anteriormente o mesmo método para garantir a vitória de Trump, nos EUA, e do Brexit, no Reino Unido, nem tampouco se pode esquecer do apoio massivo das igrejas cristãs neopentecostais no processo eleitoral.


O fato é que, desde o segundo turno, e após na composição do governo federal, se formou a aliança governamental mais reacionária da história do Brasil, juntando militares saudosistas da ditadura, economistas ultraliberais, corporações midiáticas, cristãos conservadores, ruralistas “modernos” e/ou envolvidos com milícias rurais e juristas ideologicamente fascistas (sem esquecer a vinculação do clã Bolsonaro com a milícia urbana, em sua base eleitoral, o Rio de Janeiro).

A entrega do Ministério do Meio Ambiente a um aliado dos ruralistas, o advogado Ricardo Salles, que já havia sido condenado, em primeira instância, por crime ambiental à época em que foi Secretário de Meio Ambiente do Estado de São Paulo, é a garantia de que aquilo que Bolsonaro falou na campanha não era simples retórica eleitoral, mas, um plano de governo que passava (e passa) inicialmente pelo desmonte da ainda que insuficiente estrutura governamental dos órgãos de controle ambiental.


A lista de ações administrativas, já implementadas em apenas nove meses, que, criminosamente, tem desmontado a política nacional de meio ambiente e do sistema de órgãos responsáveis por sua implementação não é pequena, senão vejamos aqui, de forma bastante resumida: a) cortes de recursos orçamentários: 167 milhões retirados do Ministério do Meio Ambiente e 89 milhões do IBAMA , além do corte de 50% do que estava previsto para o PREVFOGO; b) demissão de 21 dos 27 superintendentes regionais do IBAMA (alguns dessas superintendências, nove meses depois, ainda estão acéfalas); c) incidentes criados com a gestão do Fundo Amazônia, comprometendo as ações de fiscalização ambiental e combate aos incêndios; d) redução em mais de 30% das multas ambientais; e) extinção da Secretaria de Mudanças do Clima e Florestas e da Secretaria de Extrativismo e Desenvolvimento Rural Sustentável; f) redução das cadeiras no Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) de 96 para 23 membros, retirando-se, especialmente, os representantes das ONGs e da comunidade científica; g) transferência do Serviço Florestal Brasileiro do Ministério do Meio Ambiente para o Ministério da Agricultura; h) desqualificação dos dados sobre alerta de incêndios e desmatamentos detectados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais e demissão de seu chefe, o pesquisador Ricardo Galvão; i) mais recentemente, na elaboração do Plano Plurianual para os anos de 2020 a 2023, o setor ambiental praticamente desapareceu, vez que o Ministério da Agricultura e Pecuária ficou com 98,5% do que o plano define como “eixo ambiental”.


O fato é que nem os pronunciamentos de Bolsonaro, nem, principalmente, essas medidas administrativas ficariam sem consequências. O “Dia do Fogo” – uma ação criminosa orquestrada, de forma organizada, por fazendeiros na Amazônia, no dia 10 de agosto passado – foi a resposta, em forma de incêndios de florestas, áreas protegidas e terras indígenas, dos desmatadores aos apelos de seu ídolo Bolsonaro. Outra consequência do discurso de ódio do presidente é o crescimento da violência contra os povos indígenas. O Conselho Indigenista Missionário (CIMI) relatou, recentemente, que os ataques aos indígenas se intensificaram neste ano de 2019 (foram 160 em nove meses, contra 108 em todo o ano passado). No início do mês de outubro, um grupo de 14 indigenista e ex-dirigentes da Fundação Nacional do Índio (FUNAI) alertou a sociedade para o fato de que está em curso no Brasil um verdadeiro Genocídio contra os povos indígenas, principalmente as populações isoladas. Evidentemente, que tudo isso impactaria a Amazônia, sua natureza, seus povos.


A importância da Amazônia


Importante destacar a diferença entre a Amazônia Legal e o bioma amazônico. A Amazônia Legal se refere a um território geopolítico constituído pelos nove estados da federação brasileira ( Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima, Tocantins e Maranhão), contendo diversas formações florestais, predominando, claro, a Floresta Amazônica. No tocante ao bioma Amazônia, ecossistema com tipos fisionômicos de vegetação e fatores ecológicos semelhantes, este não é exclusivo do território brasileiro, percorrendo áreas de nove países: além do Brasil, a Amazônia vai estar presente na Bolívia, na Colômbia, no Equador, na Guiana, na Guiana Francesa, no Peru, no Suriname e na Venezuela. A Amazônia é a região de maior biodiversidade do planeta, compreendendo um conjunto de ecossistemas que correspondem à Floresta Amazônica, maior floresta tropical do mundo, e também a Bacia Amazônica, maior bacia hidrográfica do planeta. Sua população, no Brasil, de quase 25 milhões de pessoas, concentra uma das mais importantes riquezas socioculturais e étnicas do país, com seus povos indígenas, quilombolas, ribeirinhos e outras comunidades tradicionais, com suas culturas e modos de vida absolutamente singulares.


Pode-se dizer que, em pelo menos três aspectos, a Amazônia tem uma importância fundamental para o equilíbrio ambiental, não só da América do Sul, mas, do planeta, como bem destaca o professor Alexandre Costa. O primeiro diz respeito à biodiversidade: “a floresta é lar de aproximadamente uma entre cada 10 espécies vivas conhecidas, incluindo pelo menos 40 mil espécies de plantas, milhares de espécies de vertebrados e uma inimaginável variedade de insetos e outros invertebrados”. No que se refere à questão climática, assevera Costa o seu importante papel de regulação do carbono, afinal, “o estoque de carbono nela contido equivale a pelo menos 10 anos das emissões globais de gases de estufa por todas as atividades humanas somadas!”. Finalmente, mas, tão importante quanto os demais aspectos, Costa assim se expressa quanto ao ciclo hidrológico: “[...] cerca de 1/5 da água doce superficial do planeta escoa pela Bacia Amazônica e os chamados “rios voadores” transportam, até o Sudeste do Brasil e a Bacia do Prata uma enorme quantidade de vapor d’água que emana da floresta pela evapotranspiração”. É essa preciosidade socioambiental, ecológica, étnica e cultural que pode ser impactada por um tão ambicioso quanto deletério projeto. É o que se verá a seguir.


Projeto Barão do Rio Branco: o plano de Bolsonaro para ocupar e destruir a floresta e os povos indígenas


No último mês de setembro, o portal The Intercept Brasil, a partir de áudios e documentos aos quais teve acesso, denunciou que o Governo Bolsonaro está gestando, a partir da Secretaria de Assuntos Estratégicos, um plano, quase que secreto (porque debatido a portas fechadas), para “ocupar e desenvolver a Amazônia”, considerada a maior intervenção estatal desde a ditadura civil-militar. É o “Projeto Barão do Rio Branco”, coordenado por um militar da reserva, o Coronel Raimundo Cesar Calderaro.


O projeto prevê a construção de três grandes obras de infraestrutura, todas no estado do Pará: uma hidrelétrica em Oriximiná, uma ponte sobre o Rio Amazonas na cidade de Óbidos e a extensão da BR-163 até o Suriname. Tudo isso para explorar o que o projeto enxerga como sendo as principais “riquezas” da Amazônia: os minérios, o potencial hidrelétrico e as terras cultiváveis que ficam no Planalto da Guiana, situadas entre o Amapá, Roraima e os norte do Pará e da Amazônia. Para viabilizar o que é considerada uma retomada do sonho militar de ocupação da região, vai se buscar atrair populações não indígenas de todo o país para a Amazônia (como em outras épocas de nossa história).


A referência a populações não-indígenas não é à toa. Por mais de uma vez, Bolsonaro e seus auxiliares desdenham dos modos de vida e da cultura dos povos originários, que, em sua visão deveriam ser “integrados” ao conjunto da nação (como trabalhadores não qualificados, quiçá em situações análogas a da escravidão). Por isso, o documento identifica como inimigas as ONGS, as populações quilombolas e indígenas e os ambientalistas. O ataque não é só retórico. Segundo as organizações indígenas, citadas pela matéria, serão 27 as terras indígenas e áreas protegidas atingidas pelo projeto, algumas delas rasgadas ao meio, inclusive a Terra Indígena Wajãpi, no Amapá, onde um cacique foi assassinado por garimpeiros neste ano.


Se indígenas, quilombolas, ambientalistas, cientistas e até mesmo servidores do Ministério do Meio Ambiente foram excluídos do debate sobre o projeto, o mesmo não se pode dizer dos segmentos das forças armadas, que tem a participação de engenheiros do IME (Instituto Militar de Engenharia), que fazem uso de mapas elaborados pela Marinha Brasileira. Outro setor que tem participado dos debates e da formulação é o agronegócio. Segundo a matéria, a Federação da Agricultura e Pecuária do Pará, que reúne os fazendeiros e empresários rurais daquele estado, foram chamados para conhecer o “Barão do Rio Branco”.


Importante assinalar que o governo neofascista de Bolsonaro age como se não houvesse uma Constituição no país, que, desde 1988, fruto do processo de redemocratização, consagra os direitos ancestrais dos povos indígenas, bem ainda de quilombolas e outras populações tradicionais. Para viabilizar o Projeto Rio Branco, seria necessário retroceder à Carta constitucional de 1967, emendada em 1969, tributária do golpe civil-militar que instaurou a ditadura no país. Seria outro golpe; ou autogolpe, mas, não duvidamos de que esse é o desejo de Bolsonaro et caterva. Porém, há resistência no país. E é preciso barrar Bolsonaro e sua política diabólica.


É PRECISO PARAR BOLSONARO E BARRAR SUA POLÍTICA DE MORTE E DESTRUIÇÃO


Neste primeiro ano, ainda inconcluso, desse verdadeiro desgoverno – ou antigoverno – Bolsonaro, não foram poucos os atos e eventos de resistência a todas as medidas, não apenas de natureza indigenista ou socioambiental, que agridem a Constituição e direitos fundamentais já por ela consagrados. Parte grande dessas mobilizações, teve uma participação fundamental das lideranças dos povos originários, conduzidos especialmente pela Articulação dos Povos Indígenas, coordenada por Sonia Guajajara, com o apoio importante da única parlamentar indígena, a deputada Joênia Wapichana; sem olvidar, ainda, a autoridade moral do nonagenário e lendário Cacique Raoni Metuktire. Depois das grandes mobilizações em janeiro (o Janeiro Vermelho), abril (Acampamento Terra Livre) e agosto (Marcha das Mulheres Indígenas), em outubro e novembro, uma jornada das lideranças estará percorrendo o continente europeu para denunciar toda essa política deliberada de massacre.


O líder indígena Raoni Metuktire junto às mulheres lideranças da Amazônia Angela Kaxuyana e Puyr Tembé, da COIAB - Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira. Foto: Mídia NINJA

Sabem as lideranças indígenas que a denúncia e a solidariedade internacionais são fundamentais para barrar essa necropolítica. Redes de supermercados e mesmo consumidores pregam claramente o boicote a produtos brasileiros, em especial, aqueles oriundos das atividades da agropecuária. A gigante sueca da área de moda H&M (segunda maior varejista do mundo) não ficou na ameaça, suspendeu a compra de couro no Brasil. Também fundos de investimento de 30 países, que movimentam algo em torno de 16 trilhões de dólares, publicaram um manifesto dirigido ao governo brasileiros, cobrando medidas efetivas de proteção da floresta amazônica.


Esses exemplos apontam para um instrumento de pressão importantíssimo a ser utilizado, mundialmente, para barrar os planos de Bolsonaro. Por isso, propor, defender e lutar por um boicote mundial aos produtos brasileiros, em especial, aqueles diretamente ligados à devastação da Amazônia – as comodities oriundas das atividades madeireira, minerária, agrícola e pecuária –, deve ser obrigação de todo(a) cidadã(o) planetário(a), de todo movimento social, sindical, popular e ecológico, e de todo partido e de cada governo democrático e humanista. No mesmo sentido, se encontra a pressão para que os governos europeus não referendem o acordo com o Mercosul, a não ser que haja uma mudança radical na política anti-ambiental e anti-indígena do governo brasileiro.


À denúncia da degradação da principal floresta tropical-úmida do planeta devem se somar medidas concretas que apontem no sentido de isolar o (anti)governo Bolsonaro internacionalmente, em todos os fóruns políticos e econômicos. Não se deve esquecer, ainda, o apoio que deve ser dado à inciativa de abertura de processo, no Tribunal de Haia, contra Bolsonaro, por Ecocídio e Crimes contra a Humanidade.


É preciso resgatar - agora numa perspectiva internacionalista - a proposta genial de Chico Mendes, que criou, ainda na década de 1980, a União dos Povos da Floresta, juntando, à época, seringueiros, indígenas, quilombolas, ribeirinhos, e ampliar, agora, essa união para uma escala planetária, com uma grande articulação mundial em defesa da Amazônia e de seus povos, não só por ser fundamental para preservar o mais importante e rico bioma da Terra, mas por compreender sua importância vital para o equilíbrio climático, para a biodiversidade, para os ciclos hidrológicos e para a preservação de culturas e modos de vida tão ancestrais quanto sustentáveis. Defender a Amazônia é defender o Planeta, o Clima, a Vida, a Humanidade.

 

JOÃO ALFREDO TELLES MELO - Advogado, professor universitário, ex-parlamentar, presidente da Comissão de Direito Ambiental da Ordem dos Advogados do Brasil, seção do Ceará, ex-consultor do Greenpeace Brasil.


DEODATO DO NASCIMENTO AQUINO - Técnico em Agropecuária, Engenheiro Agrônomo - Perito Federal Agrário, mestre em Agronomia, Doutor em Engenharia Agrícola (Manejo de Bacias Hidrográficas no Semiárido – UFC/INPE). Palestrante no ano de 2012 da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, Rio +20

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