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O IMPERIALISMO DE TRUMP SOB O OLHAR DE LIMA BARRETO


- IBRAIM ROCHA -


Imagem: Jim WATSON / AFP
Imagem: Jim WATSON / AFP

A mídia tem caracterizado a política externa do primeiro mês do governo Trump como ações fora da curva do modelo de "democracia" americana. Considera-se que o líder da MAGA (Make America Great Again) vociferou a proposta de comprar a Groenlândia, não descartou o uso da força militar para retomar o Canal do Panamá e obteve sucesso em afastar uma nação da América Central de acordos com a China, mediante pressão econômica. Sem pedir desculpas por afirmar que o Canadá deveria ser um Estado americano e "se livrar da linha traçada artificialmente" na fronteira entre os dois países, agiu de forma feroz com políticas tarifárias contra Canadá e México — por ora, com sanções suspensas.


Não é à toa que, em seu discurso de posse em 20/1/2025, Trump elogiou o presidente William McKinley (1897-1901), símbolo da vitória na Guerra Hispano-Americana (1898) e do expansionismo que permitiu aos EUA assumir o controle de Guam, Havaí, Porto Rico, Cuba e Filipinas. Também destacou a busca por um acordo com a Rússia na guerra na Ucrânia e declarou abertamente o plano de construir uma "Riviera do Oriente Médio" na Faixa de Gaza, com apoio explícito de Israel.


Na cobertura midiática, parece existir um "imperialismo do bem" e um "imperialismo do mal": intervir na Ucrânia contra a Rússia ou apoiar Israel no massacre de palestinos pode ser considerado "legítimo" ou não, dependendo dos interesses dos EUA. No entanto, omite-se discutir os resultados econômicos e o controle de riquezas como fio condutor dessas ações, muitas vezes mascaradas por discursos de valores democráticos.


Entretanto, ao analisar a política externa dos EUA sob Joe Biden como práticas de imperialismo — que buscam expandir ou manter influência econômica, política e militar sobre outros países, em detrimento de sua soberania —, não há diferenças substanciais entre as parcerias estratégicas. Exemplos incluem a aliança AUKUS (EUA, Reino Unido e Austrália) para conter a China, a manutenção de tropas no Iraque e Síria mesmo após a retirada do Afeganistão (2021), e as sanções econômicas contra Venezuela e Cuba, com impactos devastadores na população civil.


Os EUA seguem como o maior exportador de armas do mundo, e o governo Biden aprovou vendas de armamentos para países em conflitos. Tais ações são justificadas como "proteção de interesses nacionais" ou "promoção da estabilidade global", mas seus efeitos sobre a soberania de nações e populações são os mesmos de sempre. A novidade é que Trump se apoia, além de discursos inflamados, em uma poderosa rede de algoritmos capazes de transformar mentiras corporativas em "verdades" a serviço do capital.


Nada disso surpreende, pois o imperialismo é inerente à política externa americana. Como bem resumiu Lima Barreto em "São Capazes de Tudo" (11/1/1911), ainda há quem se iluda sobre a natureza dessa política. Suas palavras permanecem atuais:


“Wilson ou outro qualquer, quando fala bonito do alto daquele Capitólio Pele Vermelha, representa um trust financeiro (...) e julga os interesses do mundo pelo prisma dos interesses desse trust. Não há nada de ideológico nas suas palavras ou, melhor, nas suas intenções. Ele doura a pílula e é todo atual e interesseiro como os vendedores da pomada vienense, ali na Rua do Ouvidor.

(...)

É dos nossos dias os generosos propósitos yankees com relação a Cuba. Vimos como a América do Norte promoveu traiçoeiramente a guerra com a Espanha; vimos como a derrotou; vimos como se apoderou de Porto Rico e das Filipinas; e estamos vendo o que é a Independência de Cuba! E o Havaí?

(...)

Se lêssemos autores corajosos, sinceros e honestos, veríamos bem que os processos políticos dos Estados Unidos são os mais ignóbeis possíveis: que eles têm por nós um desprezo rancoroso e humilhante; que quando falam em liberdade, em paz e outras coisas bonitas, é porque premeditam alguma ladroeira ou opressão.”


O que há de novo é que o trust agora fala diretamente do Salão Oval da Casa Branca, como fez Elon Musk. A disputa entre monopólios capitalistas nunca foi tão acirrada. Então, nas palavras de Lênin: “O imperialismo é o capitalismo na fase de desenvolvimento em que ganhou corpo a dominação dos monopólios e do capital financeiro, adquiriu marcada importância a exportação de capitais, começou a partilha do mundo pelos trusts internacionais e terminou a partilha de todo o território do planeta entre os países capitalistas mais importantes.”



 

Ibraim Rocha é Procurador do Estado do Pará, Mestre em Direito Processual Civil e Doutor em Direitos Humanos e Meio Ambiente. Membro do Instituto Brasileiro de Advocacia Pública e colunista da Revista Pub Diálogos Interdisciplinares. Sua coluna é publicada sempre no dia 21 de cada mês.



1 Comment


Guilherme José Purvin de Figueiredo
Guilherme José Purvin de Figueiredo
Feb 23

Ibraim Rocha traça um paralelo entre as críticas do grande escritor Lima Barreto no início do Século XX e a política atual de Trump, mostrando que a essência do imperialismo norte-americano permanece inalterada. Assim como Barreto via os EUA manipulando Cuba e tomando territórios como Porto Rico, Filipinas e Havaí sob justificativas falsas, Ibraim aponta como Trump segue essa mesma linha ao buscar expandir sua influência sobre a Groenlândia, Panamá e outros territórios.

Ao inserir essa referência literária e histórica, o texto amplia sua argumentação, sugerindo que o imperialismo americano não é novidade, apenas se adapta a novos contextos, mantendo sua essência predatória. Além disso, a citação de Barreto reforça a tese central do artigo: o poder político e militar…

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