-RUI VIANNA-
Lanço o aviso, logo de início: este é um artigo de opinião. Como tal deve ser entendido, como tal deve ser tratado.
A leitura da Carta em Defesa do Pantanal Matogrossense me trouxe, de imediato, uma sensação contraditória, intensa, dilacerante. Estamos diante de uma situação limite, o ponto sem volta, onde a natureza, covardemente atacada, sangra, arde, morre.
Diante disso, o IBAP (Instituto Brasileiro de Advocacia Pública), a APRODAB (Associação do Professores de Direito Ambiental) e a Comissão de Meio Ambiente da OAB/SP, tomaram a pulso a tarefa de sacudir a opinião pública através deste vigoroso documento, expressando em palavras duras (e justas), minha indignação. Mas não só minha. No dever ser, a indignação que caberia à toda a sociedade, em defesa da vida, do meio ambiente, da fauna, da flora, da sobrevivência da espécie humana.
Expressa a revolta pelo abandono criminoso das instituições ao que deveria ser sua tarefa primordial : Frear a destruição irresponsável de um bioma tão complexo quanto delicado, como bem dito:
" As instituições contemplam passivamente a situação. Alguns jornais dão amplo destaque ao assunto, constituindo exceção à regra; outros colocam notas laterais a respeito do assunto, quando muito tratando do tema como notícia-mercadoria que só interessa na medida em que fomenta o aumento de publicidade. A voz do Ministério Público é praticamente inaudível diante do ruído generalizado da pandemia. A Advocacia Pública é acuada em sua missão quando os chefes das pessoas jurídicas de direito público interno buscam obrigá-la a atender servilmente aos seus desmandos. E o Poder Judiciário, quando instado, responde com uma lentidão exasperante, parecendo não vislumbrar uma tragédia de proporções planetárias que não será evitada com simples palavras amigas ao meio ambiente em acórdãos ineficazes."
Com tal contundência veio à luz a iniciativa, que, rapidamente, sensibilizou as várias entidades e pessoas que expressaram seu apoio ao conteúdo da Carta, numa corrente de insatisfação e revolta espontânea e contagiante. Vê-se a presença das mais variadas entidades, ligadas ao mundo jurídico, ambiental, das artes, esportes. Assim, em menos de 24 horas, a repercussão deste documento é, de forma natural, diretamente proporcional à magnitude da tragédia ambiental, política, jurídica e social que representa o atual momento, em suas imagens terríveis e seus resultados irremediáveis.
O suceder de fatos que deveriam nos assombrar, pelo potencial destrutivo e pelo caráter catastrófico, parece não sensibilizar a maior parte das pessoas, que seguem entorpecidas sem se dar conta do quanto essas hecatombes ambientais (Queimadas no Pantanal e desmatamento na Amazônia ameaçam comunidades , Destruição ambiental no Pantanal e na Amazônia já atinge Sul e Sudeste, Violência e destruição ambiental avançam durante a pandemia ) alterarão definitivamente a vida no Planeta.
Enquanto isso, o Presidente da República, na abertura da Assembléia Geral da ONU, dispara um sem número de mentiras deslavadas, sem nenhum pejo ou pudor, acusando "indígenas e caboclos" pelas queimadas que ele, reiteradamente, disse não existirem, "a Venezuela" pelo óleo derramado nas costas do Brasil, desrespeitando não só a opinião pública mundial, como a população brasileira e a ordem jurídica (Bolsonaro mente sem pudor na ONU: culpa indígenas por incêndios e Venezuela por óleo no Nordeste). Até quando teremos que tolerar comportamento tão aviltador do cargo que, desafortunadamente, lhe foi conferido pelo voto popular?
Até o momento, vemos notícias sobre a Carta, em vários veículos de comunicação, o que demonstra o acerto e a grandeza deste documento.
- Notícias da OAB/SP - Comissão de Meio Ambiente da OAB SP assina Carta em defesa do Pantanal Matogrossense
Além da publicação da Carta, foi protocolada junto ao STF uma petição, apresentando o integral conteúdo da Carta em Defesa do Pantanal Matogrossense, para que
"...sirva de subsídio documental jurídico e político à audiência pública convocada pelo Exmo. Sr. Ministro Luís Roberto Barroso na ADO 60 reautuada como ADPF 708, que se realiza nestes dias 21 e 22 de setembro de 2020, solicitando-se o registro oficial do recebimento da carta e sua anexação à Ata da Audiência Pública.
Requerem, ainda, que a carta sirva à sensibilização do Ministro Relator da ADPF 708, Exmo. Sr. Dr. Luís Roberto Barroso, e de cada um dos Ministros desta Egrégia e Suprema Corte, sobre a responsabilidade que recai sobre vossos ombros, no julgamento urgente da ADPF 708, acerca da implementação efetiva da Política Ambiental Brasileira e destinação de recursos vinculados a combater energicamente e inadiavelmente as mudanças climáticas, a fim de salvaguardar não só mais as futuras gerações, mas também as presentes."
Finalmente, necessário destacar que a atuação ministerial nesse torvelinho demoníaco de catástrofes tem sido criminosamente conivente, omissa, irresponsável, imediatista e totalmente desprovida de qualquer técnica, a não ser a de destruição e morte. É o que depreendemos claramente do fato de que o ministério do Meio Ambiente ter suspendido o combate às queimadas, por pretenso corte de verbas determinado pelo Governo Federal (Amazônia em Chamas 20: Enquanto Salles e Mourão têm atritos, queimadas na Amazônia continuam aumentando), fazendo, de maneira torpe, "passar a boiada", como afirmado na Carta.
Expresso, neste breve artigo, meu orgulho de ter feito parte dessa iniciativa, como disse no título, inestimável, e agradecer a oportunidade de estar ao lado de tantos e tantas que comungam comigo a mais insuportável indignação por esse estado de coisas, entendendo ser imperativo darmos a isso um BASTA!
RUI VIANNA é advogado aposentado e associado do IBAP
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