- Ana Cláudia Leite Dantas Ferreira -
Estamos caindo de saber que a trindade “Liberdade, Igualdade e Fraternidade” nunca vai perder seu teor extremamente utópico frente à realidade dos governos modernos, mas me encanta a possibilidade de se refletir sobre tais conceitos, geração após geração, desde a mais tenra idade, incentivados por cartilhas e livros de história da França. Creio que isso sirva mais ou menos como manter uma carranca na porta de casa: é bom para espantar mau-olhado.
Nós, brasileiros, temos mais facilidade para agir como americanos do norte, cujo lema tem mais a ver com morte. Após o golpe de Estado de 2016, José Serra foi escolhido a dedo pelos investidores do petróleo, para, pela segunda vez, fatiar o inédito pré-sal — descoberto por brasileiros, em território brasileiro e com know-how totalmente brasileiro. A intensão era leiloar — como já havia sido leiloado no governo de Fernando Henrique e desfeito no governo Lula —, do modo mais baratinho possível, todo o nosso petróleo entre a ExxonMobil, a Chevron, a British Petroleum, a Royal Dutch Shell, a Total S.A. e outras afins ricas e felizes como essas. Lembro que, quando se definiu as partes do tesouro para cada qual, uns franceses apareceram em teles-jornais, muito alegres, dizendo que nunca compraram lotes de petróleo tão barato. Depois dessa façanha, eu só vi o Serra novamente quando, no plenário, jogou ao chão e pisoteou em abaixo-assinados vindos da população brasileira, como apelo para que se findassem tais barbaridades.
"nosso povo estaria em melhor situação se prestasse mais atenção à França do que aos EUA"
Creio que o nosso povo estaria em melhor situação se prestasse mais atenção à França do que aos EUA, o lema que ecoa ao público, naquele país da Europa, bem poderia atravessar o Atlântico e desembocar neste meu país. Nosso Brasil está doente e o povo assiste ao descalabro calado sem reação ou protesto. Ao passo que, em Paris, neste sábado, 16 de março, a manifestação dos Gilets Jaunes (Coletes Amarelos) reuniu cerca de oito mil manifestantes, muitos deles, “extremamente violentos”, como disse Christophe Castaner, o ministro do interior.
Os coletes amarelos formam um grupo apartidário e espontâneo que compreende manifestantes de esquerda como de direita e até dos extremos, que vem crescendo dos subúrbios aos centros urbanos da França e sendo exportado para outros países do entorno. O grupo reuniu mais de oito mil pessoas na Champs Elysée. Eles são bravos, segundo Castaner, o ministro, muitos deles “não são manifestantes ou agitadores, são assassinos”. Mas eles não lutam por um ou outro tema e sim pelo que consideram errado, aquilo que afeta de fato o custo e a qualidade de vida. Quando se constatou que em um ano a variação no preço da gasolina foi de 23%, e que a incidência de impostos variava de 56% a 60% dos preços do produto na bomba, a insatisfação foi geral e os coletes amarelos ameaçaram, levando o governo francês a se empenhar mais por melhores recursos.
Bom, dizem que franceses são meio brutos por natureza, a exemplo disso temos Obelix, que carregava vários javalis de uma tacada só. Então, eles não são bonzinhos... Mas é para sermos bonzinhos com aqueles que nos exploram? Bem que eu gostaria de vê-los contra o nosso governo, adoraria mais ainda se o duelo de gigantes se desse com nossos brasileiros da gema, eu estaria lá, no meio, nem que fosse para dar guarda-chuvada. Pronto, falei.
Ana Cláudia Leite Dantas Ferreira é poeta, professora, desenhista e escritora. Aprendeu com os passarinhos a amar o cheiro do orvalho na grama de manhãzinha e, com os gatos, as delícias da brincadeira despreocupada. Fã incondicional de Quintana, passarinha pela vida, porque não está aqui de passagem.
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