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Dia Internacional da Mulher: “nenhum direito a menos”

Atualizado: 5 de dez. de 2023

-Sandra Cureau-


A Organização das Nações Unidas declarou 1975 o Ano Internacional da Mulher. Ações e jornadas em todo o mundo foram desenvolvidas para promover a igualdade de gêneros e a proteção dos direitos das mulheres. Em 1977, a ONU oficializou a data 08 de março como o Dia Internacional da Mulher.


Ao contrário de outras datas comemorativas, impulsionadas pelo comércio, o dia 8 de março remete a lutas pela igualdade civil, pelo direito de voto e pela paridade de salários e condições de trabalho.


Ao longo dos tempos, homens de todas as raças, religiões e origens se conectaram pela crença comum de que uma ordem social patriarcal era a única fundação possível de uma sociedade. Conforme John Stoltenberg (Toward Gender Justice), “no patriarcado, a norma cultural de identidade do homem consiste em poder, prestígio, privilégio e prerrogativa acima e contra a classe das mulheres.” Por essa razão, homens sempre foram árbitros de identidade, tanto da masculina quanto da feminina.


Ocorre que, desde o século XIX, desenvolveram-se lutas feministas por melhores condições de salário, pelo direito de voto e por condições de vida compatíveis com a dignidade humana. Nesta época, organizações socialistas e sufragistas feministas já defendiam a criação de uma data que lembrasse a luta das mulheres pela igualdade de direitos.


No dia 20 de fevereiro de 1909, o Partido Socialista dos Estados Unidos da América organizou, em Nova York, uma jornada de manifestação pela igualdade de direitos civis e em favor do voto feminino, o que, segundo alguns, foi o embrião da futura celebração anual.


Na verdade, não é possível afirmar que este ou aquele movimento tenha inspirado a criação do Dia Internacional da Mulher, uma vez que todos foram importantes para a valorização do papel social das mulheres e para a promoção da igualdade de gênero.


Acrescente-se mais que, excetuando-se o bloco soviético, no resto do Ocidente o Dia Internacional da Mulher só foi comemorado durante as décadas de 1910 e 1920. Posteriormente, a data caiu no esquecimento e só foi recuperada pelo movimento feminista, na década de 1960.


Alguns fatos, sem dúvida, serviram para alertar a sociedade sobre o flagrante desequilíbrio existente entre homens e mulheres nos ambientes de trabalho. Em 25 de março de 1911, um incêndio de grandes proporções atingiu a fábrica de roupas Triangle Shirtwaist, em Nova York, matando 146 pessoas, das quais 125 eram mulheres, em sua maioria imigrantes judias e italianas, com idade entre 13 e 23 anos. As saídas da fábrica estavam trancadas, para impedir que houvesse pausas das trabalhadoras durante o turno de trabalho. O noticiário que se seguiu revelou que as vítimas tinham cargas horárias superiores a 16 horas diárias, salários aviltantes e locais de trabalho insalubres (Estadão, 06/3/2020).


Na Europa, durante as conferências de mulheres da Internacional Socialista, em 1910, na cidade de Copenhague, Clara Zetkin, marxista e feminista alemã, uma das fundadoras da Internacional Socialista de Mulheres (1907) sugeriu a criação de uma jornada de manifestações anual, que paralisasse as fábricas e chamasse a atenção da sociedade para as demandas feministas. A conferência, realizada em Copenhague, Dinamarca, reuniu mais de 100 mulheres de 17 países, pertencentes a sindicatos, partidos socialistas e associações de trabalhadoras, incluindo as 3 primeiras mulheres eleitas para o parlamento da Finlândia. A proposta foi aprovada e assim se celebrou pela primeira vez na Áustria, na Dinamarca, na Suíça e na Alemanha o Dia Internacional da Mulher (vide Autonomia Literária, 08/03/2019).


Alguns anos após, em 8 de março de 1917, aproximadamente 90.000 operárias russas saíram às ruas para protestar contra o Czar Nicolau II, insurgindo-se contra as más condições de trabalho, a fome e a participação da Rússia na Primeira Guerra Mundial. A manifestação, que ficou conhecida como “Pão e Paz”, é apontada por historiadores como um dos eventos que desencadearam a Revolução Russa (Estadão, reportagem já citada). Nos anos seguintes, as mulheres russas seguiram repetindo a celebração, instituída como Dia Internacional da Mulher pelo movimento internacional socialista.


Dessa forma, embora não haja convergência quanto à origem da comemoração, diante das múltiplas manifestações de luta de mulheres por todo o mundo, certo é que a data acabou consolidando-se como um marco da luta das mulheres pela igualdade.



E é isso que estamos celebrando: as vitórias conquistadas por nossas antecessoras, com a ressignificação do papel feminino na sociedade.


No entanto, a luta não acabou. A desigualdade entre os gêneros ainda se manifesta no mercado de trabalho, com salários menores para mulheres que desempenham as mesmas funções que os homens. Ou na política, que conduz à composição quase exclusiva das Casas Legislativas por homens, embora o eleitorado feminino seja majoritário no Brasil.


Não se pode esquecer a desigualdade na jornada de trabalho, que faz com que mulheres exaustas somem as horas de trabalho assalariado aos afazeres do lar; nem as famílias monoparentais, sustentadas, em sua imensa maioria, por mães de família.


Em vez de flores e congratulações, nós mulheres queremos ser celebradas como seres humanos de igual valor, com as mesmas oportunidades que são concedidas aos homens. Queremos ser respeitadas, intelectual e fisicamente, e ter nossa dignidade assegurada em todos os momentos, porque homens e mulheres são iguais perante a lei e é isso o que precisamos transformar em realidade.

 

Sandra Cureau é Subprocuradora-Geral da República, faz parte da diretoria da Associação dos Professores de Direito Ambiental do Brasil – APRODAB e do Instituto Brasileiro de Advocacia Pública - IBAP, fez mestrado na UERJ, foi Vice-Procuradora-Geral Eleitoral (2009/2013) e Vice-Procuradora-Geral da República (jul/set 2013).

 

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