- Ciro Yoshiyasse -
1.
É um velório de menino. Dezenas de coroas brancas, há brinquedos, bolas, uma bíblia infantil, uma imagem de Santa, vidros com areia, pedrinhas brancas, bonecos e um troféu em frente ao pequeno caixão. Mulheres com lágrimas secas nas faces afagam o menino que, não... não parece dormir.
Não há outras pessoas sendo velados, eu faço minha oração e saio (- eis aqui o refúgio, a iluminação no acolhimento infinito).
A construção foi erguida na parte elevada atrás da capelinha, é mais bonita do que o salão comum logo abaixo. Espero diminuir a fila destes velhos militantes atrás do café da lanchonete. Passei um bom tempo conversando com o Gegê, falamos sobre a jovem militância, o velho Clóvis, música e ocupações.
Ele vestia um jaleco da Petrobrás, que ganhou durante a greve de fome.
Volto no tempo, ao velório de minha mãe. A lanchonete não era aqui. Não havia luzes e nem pessoas pelos cantos trocando murmúrios.
Nem cinco viaturas na frente do velório com suas luzes insuportáveis.
2.
A chuva cintila e alivia o fundo escuro da noite
As almas hoje voarão facilmente pelo céu
Elas escapam pelas janelas
Se for uma criança a noite será especial.
Piruetas, queda em parafuso, giro, fuga
Mas Arthur olha pra nós aqui
-olha o vô!
e se lembra como era ter peso
todo o peso do mundo
Ciro Yoshiyasse é Tecnólogo pela FATEC-SP, editor e ilustrador da Revista Mouro.
Muito comovente!
Descanse em paz Arthur...certo que seu avô é inocente de todas as injúrias que sofre...